25 de setembro de 2010

Aferições...

Foi apresentado (sem pompa nem circunstância, como a actual "crise" obriga) o Plano da Educação para o próximo triénio.
Das novidades esperadas, poucas (ou nenhuma, para ser sincero) surpreendem. Contudo, há uma ou duas questões que nos podem (devem) assustar.
A primeira (e para mim mais pertinente) prende-se com o "objectivo" de "aumentar e melhorar os resultados escolares dos alunos". Este objectivo, sem dúvida adequado, vem, no entanto, "embrulhado" num presente explosivo: faz-se depender os níveis de partida dos resultados das provas de aferição.
Até aqui, para um leigo, julgo não existir qualquer tipo de problema.
Mas, se quisermos ir um pouco mais ao fundo, e, principalmente se conhecermos algumas das premissas que consubstanciaram a existência de provas de aferição, não podemos deixar de nos preocupar.
As provas de aferição, apresentadas, na sua génese como uma forma de "aferir" as aprendizagens dos alunos em diversos momentos da sua frequência escolar, foram, num primeiro tempo, "construídas" como elementos avaliativos de "menor importância". Posteriormente, com o surgimento da regulamentação do modelo de Avaliação de Desempenho dos Docentes, foram apontadas como elementos contributivos.
Após a contestação que tal procedimento motivou, o Ministério da Educação recuou e deu por "dispensáveis" estes elementos de avaliação.
Contudo, porque havia que enviar dados para a Europa, continuaram a realizar-se e (aqui é que é importante parar!) de certa forma, porque seria importante maquilhar os números (subsídios "oblige"!), organizaram-se de forma a "simplificar" e "inflacionar" os resultados reais.
Quem esteve envolvido nos imensos grupos de correctores, supervisores e acompanhantes, sabe que a "ordem" era (é!) para "subir", ou seja, "em caso de dúvida, favorece-se o aluno". Claro está que, neste momento nem me interessa discorrer sobre as "enormidades" que daí advieram, com especial enfoque nas "actualizações conceptuais", que, em alguns casos tornaram credíveis e acertadas lógicas e procedimentos que, desde sempre, foram considerados errados e negativamente "educativos"...
Mas, como escrevia, o que me assusta não é tanto as questões das "enormidades" nas próprias provas e no processo de elaboração/execução, mas sim no "futuro próximo", que faz garantir os resultados a atingir pelas Escolas com base nos resultados das Provas de Aferição.
Se tivermos em conta o estado bastante inflacionado dos resultados, podemos, desde já, imaginar o esforço hercúleo que as escolas terão para suplantar os valores que, por "obrigação" administrativa, tiveram de apresentar. Quer isto dizer que, por exemplo, as escolas terão como valores de referência (para a "melhoria dos resultados escolares dos alunos") valores completamente inalcançáveis.
Posto isto, resta-me dizer: e nós, estamos à espera de quê?

3 de setembro de 2010

5 Mitos sobre "Complexos Escolares"...

Muito se tem falado, por estes últimos dias e na sequência do encerramento de (tantas!) escolas, nomeadamente no já desertificado interior rural do país, dos Complexos Escolares.
Sem dúvida que, na maior parte dos casos, devemos reconhecer que os custos associados à manutenção de espaços, equipamentos e pessoal, bem como à rentabilização social e pedagógica do investimento são, à luz dos "novos" parâmetros económicos (ou economicistas!), desnecessários e até de evitar.
Contudo, esta "normalização económica" faz com que as velhinhas "escolas" do Plano Centenário, as P3 ou mesmo as escolas da República que, em alguns casos, durante mais de 50 anos se mantiveram como efectivo centro cultural e social de um determinado local, fiquem, literalmente, votadas ao abandono.
Esta é, talvez, uma das análises a fazer, no que concerne às questões associadas ao problema da "desertificação".
Contudo, e após prática de cinco anos em "Complexos Escolares", que, grosso modo, dou como positiva, levantam-se algumas questões que resolvi considerar como Mitos Associados aos Complexos Escolares.
A ver:

Mito 1. Os complexos escolares disponibilizam melhores espaços.
Não sendo completamente errada esta afirmação, há, contudo, que fazer algumas ressalvas, nomeadamente no que diz respeito à qualidade dos espaços, à sua adequação e adaptação.
Acredito que as equipas que os planeiam, organizam e constroem estão imbuídas de nobres intenções, contudo (e claro que falo apenas da minha experiência) falta alguma sensibilidade pedagógica e mesmo social na sua concepção.
Como "casos concretos", apresento apenas algumas "questões" que vale a pena reflectir: porque é que, na maior parte das vezes, os espaços (salas) dedicados a actividades de complementos educativo (prolongamentos, ATL, CAF, etc.) são espaços mal equipados, distantes da entrada/saída dos edifícios (tendo em conta que, será, teoricamente nestes espaços que se fará a recepção/entrega dos alunos) e, normalmente insuficientes para a totalidade dos alunos que o vão frequentar (se considerarmos, num complexo escolar de média dimensão - cerca de 300 alunos - que a(s) sala(s) dedicadas a estas actividades têm, no máximo 60mt2 para cerca de 20% dos alunos, ou seja, cerca de 60 alunos, significará menos de 1mt2 por aluno)?
Ou, em alternativa, a questão de acessibilidade: quando se juntam salas de pré-escolar e de primeiro ciclo na mesma escola, com, normalmente as primeiras a ocuparem os pisos térreos, porque então colocar "serviços" (biblioteca, salas de informática, etc.) nos pisos superiores?
Impedem um fácil acesso e tornam-se "pouco utilizados".

Mito 2. Os complexos escolares dispõem de melhor equipamento
Sem dúvida que, na maior parte das vezes, o equipamento disponível é melhor adequado e em maior quantidade, contudo, as "salas de informática", as bibliotecas, os refeitórios e outros espaços "multidisciplinares" e multifuncionais pecam pela necessidade de manutenção e gestão que, na maior parte das vezes é inexistente ou desadequada.
Veja-se o caso das salas de informática. Com equipamentos "avançados" (nas palavras dos gestores), mas, normalmente, mal organizados e com questões complexas de gestão. A organização e manutenção é assegurada por técnicos autárquicos, correntemente sem qualquer formação pedagógica e "com pouco tempo" para assegurar um efectivo acompanhamento; as salas não são desenhadas de acordo com as necessidades educativas; não dispõem de equipamento acessível a todos (especialmente nos casos de alunos com Necessidades Educativas) e, na maior parte das vezes, nem sequer "funcionam" como espaços pedagógicos.
Há ainda a questão dos espaços de trabalho para docentes: normalmente deficitários em termos de equipamento, não promovem, por exemplo, uma efectiva articulação educativa, pois, globalmente, mantêm as características/paradigmas das escolas que lhes deram lugar: cada um no seu canto!

Mito 3. Os complexos escolares dispõem de mais pessoal
Este mito é, automaticamente, descredibilizado pelo tipo de "atribuição" de pessoal não docente às escolas: a partir do momento em que funciona o critério "rácio", as coisas complicam-se. Ou seja, de que forma é que, existindo um rácio suportado pelo número de alunos (e, dessa forma, presumindo que a existência de pessoal não-docente é, fundamentalmente, para apoio pedagógico) se limpam e mantêm espaços "extra" (bibliotecas, salas de apoio, salas de informática, refeitórios, etc...)?
Tomemos como exemplo um espaço de jardim de infância com três salas (75 alunos) incluído num complexo escolar: se existirem duas assistentes operacionais (rácio de 1 adulto por cada 40 crianças), para, fundamentalmente, se proceder ao apoio pedagógico educativo (5 horas lectivas diárias), quem mantém (limpa) o polidesportivo, a biblioteca, os WCs, etc.? Além de que os espaços comuns da escola são também utilizados por todos os alunos e famílias do jardim de infância...

Mito 4. Os complexos escolares disponibilizam melhores serviços de apoio
Sem dúvida que, se centrarmos a "oferta" de serviços nas questões da alimentação (refeições) e do acompanhamento extra-horário (prolongamentos, actividades de enriquecimento curricular, etc.), há uma melhoria efectiva que deve ser destacada, contudo, e mais uma vez (e até por algumas "razões" antes apresentadas), se falarmos de "serviços", não podemos descurar a qualidade da oferta destes serviços, e se tivermos em atenção que, na maior parte das vezes, os serviços que realmente se poderiam destacar são fornecidos por empresas, por técnicos com pouca (ou nenhuma) formação ou ainda por funcionários com também outras funções (ou até mesmo por docentes), chegaremos, facilmente, à conclusão que os "serviços" e a forma como são prestados não correspondem aos desejos antes enunciados.

Mito 5. Os complexos escolares favorecem a Articulação/Continuidade Educativa
Este é, talvez, o mito que o é apenas porque, neste momento, é ainda cedo para avaliar, efectivamente, a transversalidade da oferta e a efectiva articulação pedagógica conseguida.
No entanto (e mais uma vez refiro a minha prática), quando estes complexos escolares comportam, fisicamente, mais de um ciclo de ensino mas apresentam, na sua construção e organização, diversos espaços delimitados e confinados, é difícil, senão impossível, aproximar técnicos, docentes, alunos...
Se num complexo escolar com dois ciclos, há duas salas de professores, uma porta que divide, fisicamente, os espaços, uma gestão que "obriga" a um "pedido de licença" específico de utilização de espaços comuns ou ainda uma "discriminação" relativa ao uso de equipamentos e materiais (fotocopiadoras, faxes, etc...), então, a "articulação" (que deveria passar por uma efectiva aproximação entre profissionais), fica condicionada à partida...
Também para os alunos, que se vêem "obrigados" a viver em espaços (parques, recreios, etc.) distintos, a articulação (pessoal e social) com outros alunos e esquemas de funcionamento, não existirá.
Pelas "razões" que apresentei e outras mais que poderia referir, há, julgo eu, bastantes condicionantes (e meramente em termos pedagógicos e educativos) a uma efectiva "vantagem competitiva" dos novos espaços escolares.
Que estas reflexões possam ajudar a resolver problemas. Sinceramente que gostava.

1 de setembro de 2010

Porquê ir "para fora cá dentro"?

A pergunta que faço, no título deste post, deve-se às experiências que me foram concedidas neste período de férias.
Por opção (forçada, mas opção), dediquei estes (poucos) dias de descanso profissional a "visitar" o que por cá temos. Devo dizer, antes de mais, que me orgulho de conhecer bastante bem o nosso país (que desde cedo escolhi conhecer) e, em alguns casos, o que optei por fazer este ano foi "revisitar" alguns sítios que não visitava há bastante tempo.
Apesar de ter começado por locais tão distantes como Caminha ou Sobral de Monte Agraço (só para lá chegar foram quase 45 minutos!), o que me chocou mais foi mesmo visitar o Castelo de S. Jorge.
Começando: já não ia visitar o local há cerca de dez anos. As memórias que dele tinham eram, apesar disso, bastante presentes. Lembrava-o como um local interessante mas um tudo nada "parado". Ou seja: um local que merece uma visita esporádica, nesse intervalo de tempo. É interessante "ver" Lisboa desse ângulo...
O que não esperava era que me pedissem sete euros (!) para aceder ao seu interior. E ainda menos esperava que se mantivesse tudo (mas absolutamente tudo!) na mesma.
É inacreditável o elevado preço para nem sequer existirem umas placas descritivas, ou algum tipo de animação, ou mesmo algo por que o preço valha...
Começa tudo na bilheteira: um conjunto de diferentes "modelos" de bilhete (com exclusão de professores que, como eu, pretendam, também, preparar uma possível visita pedagógica com os seus alunos), no qual apenas os residentes no Concelho de Lisboa têm entrada gratuita (azar o meu que resido em Odivelas!). Dos muitos "tipos" de bilhetes, nem um que pudesse "favorecer" um visitante como eu: que até convidei uns amigos para me acompanharem, e, por isso, senti-me na obrigação de lhes pagar a entrada...
Depois, lá dentro, uma imensa pobreza paisagística: apenas as fabulosas vistas de Lisboa (que, contudo, são igualmente esplendorosas a partir do "gratuito" Jardim do Príncipe Real), mas tudo o resto, decididamente, inócuo e repetitivo. O castelo de Beja, apesar de despojado de "animação", está bem melhor. E a visita é gratuita.
Por último, apenas uma esplanada (integrada no restaurante do local) onde me pediram dois euros por uma garrafa de água de 33cl...
Mas para acabar em grande, a visita pelo bairro do Castelo (que me mostrou um Teatro Romano cada vez mais votado ao abandono), grosso modo, mal cuidado e pouco "turístico (com o miradouro João Castilho votado ao abandono e à degradação) culminou no pagamento da módica quantia de 4.90€ de parque, por duas horas de "visita"...
Tudo somado, o dia saiu-me por muito mais do que uma diária na República Dominicana na tarifa "tudo incluído"... E no Castelo de S. Jorge nem sequer passei a noite...
Não fossem as "mais-valias" de um "passeio" a Caminha, onde ainda é possível aproveitar, quase gratuitamente, das excelentes condições de visita e animação (além de óptimas paisagens, cuidadas e mantidas), o "ir para fora cá dentro" deixaria muito a desejar... (e nem falo no Algarve, em Torres Vedras ou no Cartaxo, por onde também andei...).
Se me sentisse bem, poderia, de certeza, ter deixado umas migalhas nos cofres das empresas (e instituições) portuguesas e, dessa forma, contribuir também com um pequeno quinhão para a recuperação económica nacional, mas, assim, a coragem não é muita.
Juro que não gastarei muito mais dinheiro a "ir para fora cá dentro". Na realidade, e apesar de defender até à exaustão o que de tão bom temos, começo a ficar cansado de que não olhem por nós. Se calhar tenho de imigrar, para que tudo me pareça mais belo quando voltar...
Tenho pena. Muita pena!