12 de novembro de 2017

Leituras nas "Redes"...

"Navegando" sem rumo nem direcção nas "redes sociais", reparo que, nos últimos dias, nos "temas" da educação, estão "em alta" as sugestões, modelos, metodologias e outras modas que, no seu "princípio" unificador, falam da autonomia, da responsabilização e da cidadania activa das crianças.
Desde as práticas de Ioga, de Mindfulness, de consciência ativa (que apesar de ser "abordado" de forma diferente, refere-se ao mesmo princípio) ou mesmo das questões neurológicas e neurocognitivas como fundamentos gerais para a "mudança de práticas" até à "formação especifica de cidadãos conscientes do espaço natural" (isto, talvez, devido ao fenômeno causado pela impotência das comunidades face aos eventos que as assolaram), há um pouco de tudo.
Na maior parte das reflexões (e posteriores comentários), também é notório que há, cada vez mais, adeptos do "fazer assim", e, de repente, na perspetiva enviesada que a consulta às redes sociais nos dá, parece que "toda a gente" é altamente versada nas ditas inovações.
E mais, que "toda a gente" já "faz assim".
Quando aprofundo um pouco mais a bibliografia e a "ciência" por detrás de muitas destes novos métodos e procedimentos que tendem a "ajudar" profissionais e famílias na alteração das evidências (quiçá negativas) nas sociedades de hoje, dou por mim a constatar que, em muitas destas "novas modas", as experiências da/na educação de infância poderiam (deveriam!) ser muito mais ilustrativas do que, na realidade, têm sido.
Não obstante ser possível observar (num ainda grande grupo de práticas de educação de infância) muita incoerência metodológica ("escrevemos" que somos pela autonomia da descoberta, mas organizamos comboios e filas para ir da sala ao refeitório, somos pela "individualidade" mas vestimos batas iguais e chapéus da mesma cor, dizemos que "cada criança é uma", mas reproduzimos vinte e cinco bonecos de neve que afixamos na parede indiscriminadamente....), acredito que é neste nível de ensino (e etário) que, de facto, se constrói uma comunidade forte, responsável e civicamente activa.
E, mais ainda, acredito que é a partir da educação de infância que se deve construir o "sistema educativo" (e não o contrário), pelo que talvez seja o tempo de todos os profissionais começarem a mostrar que educamos para o "respeito pela natureza" quando subimos as árvores, que "educamos para a Paz" quando ensinamos a gerir conflitos, que ensinamos o "respeito pela outro" quando incluímos, na nossa prática, a diferença e a heterogeneidade.
Plantemos árvores. Mas mostremos que, sem rega e sem cuidados, jamais vingarão.

Sortes...

Tive a sorte (ou a disponibilidade!) de ter frequentado a minha formação de nível superior, e, consequentemente, concluir a minha habilitação para a docência, um par de anos antes da publicação das Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar (OCEPE) em 1997.
Ao referir a "sorte", faço-o, sobretudo, porque essa proximidade permitiu-me que, durante a formação, tivesse a possibilidade de conhecer, debater, analisar e, até, questionar e sugerir sobre a base (científica, pedagógica, educativa....) que lhes deu origem.
Essa "sorte" favoreceu, sobretudo, dois factores: "construiu-me" enquanto profissional e potenciou um espírito crítico constante sobre a forma, como, por vezes, "olhei" para a sua aplicabilidade.
Ao longo dos últimos vinte e poucos anos, em escolas públicas, privadas ou cooperativas, foram muitas (imensas, diria eu!) as vezes em que me foi necessário apoiar as minhas escolhas e decisões pedagógicas, as minhas práticas e até as minhas convicções educativas no texto base legal que fornlece o compromisso educativo de todos os profissionais de educação de infância.
Mas, infelizmente, foram também muitas (a maioria, diria eu!) as vezes em que, nos "confrontos" reflexivos, didácticos, pedagógicos e educativos com outros profissionais (colegas, chefias, pares...), se tornou evidente um substancial desconhecimento dos fundamentos, bases legais e até processos que a Lei (OCEPE) define e contempla.
E, também por isso, ao longo dos últimos anos foram muitas as vezes em que me insurgi contra práticas que, não apenas não constam como "indicadas" como até são, nos seus princípios, "contra" a letra e o espírito das OCEPE.
Em todas elas, senti-me em discussões estéreis. Sobretudo, porque senti sempre que as discussões e reflexões não tinham, nos opositores, na mesma base de conhecimento e implicação. A mesma leitura e análise crítica.
Às vezes, nem sequer a leitura teriam...
"Manuais", "grelhas" (de observação, de avaliação, de "acompanhamento"), "critérios", "indicadores", "metodologias específicas", "indicações lectivas" ou outros chavões do eduquês foram entrando no mundo da educação de infância pela janela (ou porta!) que nós, os profissionais de educação de infância, fomos abrindo.
Admito que, às vezes, as referências a "decisões superiores, emanadas do Ministério da Educação" (que raramente eram reais), assustavam e desmotivavam. Mas, bastaria um olhar atento para perceber as falácias que fomos permitindo (e, de certa forma, apoiando: ora por acção, ora por omissão...)
Ao longo dos últimos vinte e poucos anos, fomos deixando que se enviesassem as bases e fundamentos educativos definidos para este nosso nível de ensino. Ao longo dos últimos vinte e poucos anos não nos interessou ler, refletir, conhecer, debater e, sobretudo, fazer nossas as Orientações Curriculares que, antes de mais, nos deveriam servir como esteio e defesa intransigente.
E isso, de certa forma, adiou, no nosso país, a assunção efectiva de que a educação de infância é “a primeira etapa da educação básica no processo de educação ao longo da vida".
Agora, e faz exactamente um ano após o seu lançamento, temos uma edição revista, actualizada e aumentada que, nas palavras do Sr. Secretário de Estado João Costa: "resulta de um trabalho de avaliação das necessidades de revisitar este documento, atualizando-o, beneficiando de cerca de duas décadas de aplicação e da auscultação de muitas instituições e indivíduos".
Passado um ano, ainda contínuo, mesmo que residualmente, a ter de me confrontar na defesa de práticas, processos e lógicas em locais onde já não o deveria ter de fazer.
A pergunta que me faço, neste momento, é: será que, de entre tantos de nós que nunca leram a edição original (e por isso persistiram em tanto equívocos), se manterá um certo alheamento? Será que vamos manter esta nossa forma muito "suí generis" de persistirmos no engano?
Será que vamos, mesmo, ler e engrandecer-nos pelo debate, reflexão, discussão e partilha?...
Quero tanto acreditar que sim.