Têm-me chegado, de forma pública e privada, vários pedidos de ajuda e/ou esclarecimentos, (talvez por saberem, na minha prática, um uso constante e intenso da internet e também do facto de manter uma veia investigadora no âmbito do uso e reflexão sobre as tão chamadas “Novas Tecnologias”) e, sobretudo, tem-me chegado informação sobre uma espécie de “manto negro” que tem vindo a atacar muitas escolas (públicas, privadas, cooperativas…) de onde têm surgido “proibições liminares” do uso de imagens e dados de alunos.
Tenho utilizado (e escrito sobre isso) a internet (blogues, redes sociais, plataformas tecnológicas, etc…) de forma constante e ininterrupta desde 2002. Desde sempre, tive o(s) cuidado(s) fundamental(ais) para que esse instrumento valioso fosse, de facto, um auxiliar otimizador da prática e das aprendizagens. Sempre usei (mesmo ainda antes de qualquer Lei mo dizer) um conjunto de rotinas com o objetivo de proteger tudo aquilo que não fosse, de facto, o interesse pedagógico da sua utilização (recolher imagens que minimizassem os riscos de identificação pessoal, reduzir o tamanho das imagens utilizadas, reunir as autorizações informadas dos representantes legais, inscrever em Projetos Curriculares o uso dessa(s) ferramenta(s), não permitir identificação pessoal alheia, etc…).
Com a publicação prevista do RGPD, entrei em contacto com a Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD) para me inteirar sobre a possibilidade de manter o uso pedagógico destas ferramentas. A resposta que obtive, baseada na Deliberação 1495/2016, diz que terá de haver o cuidado de “mesmo no contexto de uma área reservada do sítio da Internet, não deverá ser disponibilizada a toda a comunidade escolar ou a outros encarregados de educação dados pessoais relativos à vida privada e familiar dos alunos” e ainda que “Em todo o caso, compreendendo o interesse subjacente à divulgação das atividades da escola, será admissível a divulgação de imagens que não permitam a identificação das crianças e jovens – caso em que não há dados pessoais, porque os seus titulares não são suscetíveis de identificação – e, desse modo também o direito à imagem fica afetado numa muito reduzida medida, o que permite reconhecer relevo jurídico ao consentimento.
Na verdade, neste caso será igualmente necessário o consentimento prévio dos encarregados de educação das crianças, nos termos do artigo 79.º, n.º 1, do Código Civil, porquanto a identificabilidade das imagens envolve alguma dose de subjetividade, podendo ocorrer que uma imagem que, na perspetiva de um terceiro não permite a identificação da criança, seja para os pais ou para aqueles que convivam mais de perto com ela facilmente identificável, sobretudo porque contextualizada numa específica escola.
Por outro lado, mesmo que as imagens não se destinem à divulgação na Internet, mas tenham uma utilização em circuito mais fechado ou fiquem apenas para arquivo ou exposição no espaço escolar, será sempre imprescindível obter o consentimento escrito do encarregado de educação, o qual deve ser previamente informado, de forma clara e transparente, sobre o contexto da captação, os fins e a utilização a ser dada às imagens.
Por tudo isso, e porque é essencial defender os direitos das crianças na perspetiva do seu superior interesse, as escolas devem reduzir a publicação de imagem e som dos alunos ao mínimo indispensável (e não o carregamento de verdadeiros álbuns fotográficos), privilegiando a captação de imagem de longe e de ângulos em que as crianças não sejam facilmente identificáveis.”
Assim sendo, mantive a prática refletida e devidamente informada de utilizar a internet como ferramenta complementar. Não poderia fazê-lo de outra forma.
Ainda sobre o uso das tais “ferramentas tecnológicas”, quero acrescentar que nos últimos anos desenvolvi diversos projetos pedagógicos (alguns deles premiados e reconhecidos por instâncias nacionais e internacionais) onde o uso de videoconferências, a partilha de informação e a produção pedagógica de instrumentos “tecnológicos” (E-Twinning, Prémio Ilídio Pinho, Repositório de Escolas, etc.) e com recurso a imagens, “dados pessoais” e até informação específica (dados sensíveis) possibilitaram não apenas a aprendizagem e a reflexão, como, numa esfera mais abrangente, funcionaram como espaços formativos (não apenas para os alunos participantes, como também, e muito, para as famílias) essenciais.
E ainda, e como "apela" a imagem abaixo, como educar, de facto, as gerações para quem as tecnologias não são (nem nunca foram) novas?
Posto isto, pergunto-me: o que estamos a fazer a uma sociedade que se pretende Livre e Cidadã? O que estamos a fazer em nome de uma ideia de “Segurança” que atenta contra os nossos deveres e direitos cívicos (e civilizacionais)?
Assusto-me. Muito. E relembro aquele episódio da única mãe, que há uns anos, me “proibiu”, liminarmente, a utilização de imagens do seu filho (mesmo que não o identificando) na internet, e por alturas do Natal, me mostrou, orgulhosa e emocionada, a imagens do seu outro filho numa revista de grande circulação na rúbrica “Bebé do Mês”, onde, além de uma imagem de um nu integral, acompanhavam os dados pessoais, os sensíveis e todos os outros que possam imaginar…
Pensemos. Mesmo
(para consulta e reflexão, deixo dois documentos que podem ajudar à reflexão – e, se necessário, “defesa”-. Um artigo sobre o (meu) uso e prática: Mind The Gap: https://pt.slideshare.net/henriquehsantos/mind-the-gap-116147077 e uma Síntese do RGPD: https://pt.slideshare.net/henriquehsantos/sntese-rgpd. Que vos possa servir!)
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